A pobreza cresce diante dos nossos olhos. Em muitas cidades vemos famílias inteiras vivendo nas calçadas, debaixo de viadutos ou improvisando abrigos com papelão. Não se trata apenas de falta de dinheiro. Trata-se da perda da dignidade, da perda da esperança e do enfraquecimento do valor da vida humana. Ao mesmo tempo, o crime organizado avança, oferecendo aquilo que o Estado e a sociedade deixaram de oferecer: sensação de proteção, pertencimento e sobrevivência. O resultado é um mundo mais brutal, mais frio e mais desumanizado.
Muitos, diante desse cenário, levantam uma acusação contra Deus: “Se Deus existe, por que não faz nada?” A raiz dessa pergunta nasce de um equívoco. Deus não criou a injustiça, e muito menos a miséria. Como ensina São Basílio, o Grande, “os bens dados por Deus à humanidade são suficientes para todos, mas a ganância faz com que alguns tenham mais do que precisam enquanto outros nada têm.” Deus nos deu uma terra capaz de alimentar todos, mas os corações se tornaram duros.
Quando o amor se esfria, o pobre deixa de ser próximo e passa a ser visto como problema. Quando o orgulho cresce, a dor do outro se torna invisível. Quando a fé enfraquece, perde-se o senso de responsabilidade diante de Deus e do irmão.
Nesse contexto, surgem também religiões e movimentos que prometem milagres automáticos, prosperidade instantânea e soluções emocionais rápidas. São João Crisóstomo advertia que muitos procuram “um Cristo feito à imagem dos seus desejos”, não o Cristo verdadeiro da Cruz. Essas falsas promessas seduzem porque oferecem alívio, não conversão. Prometem resultados, não arrependimento. Prometem poder, não entrega humilde ao amor de Deus.
A fé verdadeira nunca se baseia em fantasia. A fé verdadeira começa pelo reconhecimento da própria pobreza interior. Se não reconhecemos nossa miséria espiritual, não veremos a miséria do mundo ao nosso redor. São Pais da Igreja insistem que o primeiro passo para curar o mundo é curar o coração.
Então, o que pode ser feito?
A resposta não está em uma solução política única ou em um plano econômico universal. A mudança começa no coração e se espalha para a vida concreta.
Caridade real: Não é simplesmente dar coisas. É olhar o outro como ícone de Cristo. São Gregório de Nissa dizia que “quem ajuda o pobre é médico de si mesmo”. Ao ajudar, curamos nossa própria dureza.
Educação do coração: Ensinar às crianças e jovens que a vida humana tem valor. Não apenas valor de mercado. Valor diante de Deus.
Comunidade viva: A Igreja é chamada a ser casa para os feridos e cansados. Não apenas lugar de discursos. Onde existe liturgia sem misericórdia, a fé se torna teoria.
Testemunho pessoal: A fé cresce quando é vivida. Quando alguém vê um cristão amar de verdade, servir de verdade, perdoar de verdade, o mundo percebe que Deus não abandonou ninguém.
Não existe transformação sem esforço, sem paciência, sem cruz. Santo Isaque, o Sírio, dizia: “Quem deseja amar como Cristo deve carregar o peso dos sofrimentos do mundo com compaixão.” A compaixão verdadeira custa. Ela exige tempo, renúncia, presença e constância.
A pobreza e o crime não vencerão o mundo se o amor perdurar. O amor em Cristo não é um sentimento. É uma decisão, um caminho e uma vocação de todo cristão. Deus não abandonou o mundo. O mundo é que está se afastando de Deus. A cura começa quando cada um volta a Ele, com o coração sincero, e deixa seu amor transbordar como luz nas trevas que nos cercam.
10.11.2025
+ Bispo Theodore El Ghandour








