Pergunta: São Sofrônio afirma que o cristão deve ter inspiração incessante em sua vida. Em que consiste essa inspiração?
Resposta: “Aqueles que são guiados pelo Espírito Santo não cessam de descer, condenando-se como indignos de Deus”, diz o Padre Sofrônio (cf. “Sobre a Oração”, p. 174). Sendo um Deus humilde, o Espírito Santo ensina a humildade quando habita no homem, e essa humildade atrai uma graça maior, que se torna verdadeira inspiração nele. Padre Sofrônio define inspiração como “a presença do poder do Espírito Santo no coração do homem” (cf. “O Veremos como Ele É”, p. 119), mas, de acordo com a lei eterna expressa nas Escrituras, “aquele que se humilha será exaltado” (Lucas 18:14) e “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Tg 4:6; 1 Pe 5:5). Consequentemente, temos inspiração em nossa vida quando somos inspirados pelo Espírito Santo a nos humilharmos para não impedi-Lo de habitar em nós. E quando o Espírito Santo habita em nós, também nos tornamos imagens de Pentecostes, falamos “palavras estranhas, ensinamentos estranhos, doutrinas estranhas” da Santíssima Trindade (Laudes de Pentecostes).
A inspiração vem quando, recebendo o dom do Espírito Santo, amamos o humilde Cristo, que então nos concede a Sua graça até o fim e nos embriaga com o Seu infinito amor divino. A inspiração vem quando o Espírito Santo nos ensina a humildade e a humildade atrai a graça, que nos une a Cristo. Então Cristo é capaz de assumir o “leme” da nossa vida, isto é, governar a nossa vida e estabelecer o Espírito Santo como nosso guia, para que possamos também dizer com São Paulo: “O Espírito Santo nos levou a Jerusalém, a Trôade, a Filipos ou à Macedônia…” (Atos 20:22). São Paulo se expressa como se tivesse um Cavaleiro sobre si, o Espírito Santo, que o guiava de um lugar para outro. Isso acontece quando o homem aprende a extrema humildade que Cristo nos ensina. Esta humildade absoluta consiste em odiar a nós mesmos em nosso estado miserável, distorcidos e feios como nos tornamos por causa de nossas paixões vis, em odiar o pecado, ao qual fomos escravizados neste mundo, “pois todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3,23). A verdadeira inspiração consiste em adquirir a humildade de reconhecer nossa corrupção e alienação de Deus à luz da palavra de Cristo; em odiar tudo o que impede Cristo de habitar em nós, em render-Lhe toda a glória e em assumir sobre nós toda a vergonha por nossa pobreza espiritual. Obteremos inspiração infinita do extremo desta humildade, que nos é ensinada pela palavra do Senhor a São Siluan: “Mantém a tua mente no inferno e não te desesperes”.
Pergunta: Um cristão pode abster-se da assembleia eucarística por um longo período?
Resposta: O Corpo de Cristo, esta maravilhosa comunhão dos Santos, é formado em cada assembleia eucarística, cada vez que nos reunimos para a Liturgia. Cristo nunca está sozinho: visto que é Ele Quem realiza o Sacramento, onde quer que Cristo esteja presente, todos os Seus Anjos e todos os Seus Santos também estão presentes. Onde quer que a Liturgia seja celebrada, toda a Igreja triunfante do céu está presente de uma forma incompreensível. Portanto, como podemos abster-nos de tal assembleia eucarística, onde Cristo está presente com todos os Seus Anjos e todos os Seus Santos, e onde podemos encontrar todos os dons dos Seus eleitos na Terra? Isso se aplica em condições normais. No entanto, a situação é muito diferente se houver uma guerra e formos levados cativos para um país estrangeiro, e ficarmos sem uma Liturgia por um ou dois anos, e talvez nunca mais retornemos ao nosso país para assistir a uma Liturgia. Ou, como em nossos tempos atuais, esta pandemia nos forçou a nos isolar por um tempo para não espalhar o vírus. Então, por necessidade, “faz-se… também uma mudança na lei”, diz o Apóstolo (Hb 7,12). Ou seja, devido a essas circunstâncias especiais, Deus nos dará outros meios de nos comunicarmos com Ele. Onde quer que estejamos, invocaremos o Nome de Cristo, lembraremos das palavras do Seu Evangelho e viveremos com elas na presença de Deus. Então, Deus nos dará todas as coisas necessárias para a salvação.
Vivemos um período muito estranho (pandemia da COVID-19), mas muitos fiéis que conhecemos nos confessaram que encontraram grande dose de graça nestes dias, que encontraram uma maneira de celebrar sua Liturgia pessoal em casa. Lendo os Salmos, recitando a Oração de Jesus e fazendo constante referência ao Evangelho, bem como a outros livros espirituais, muitos fiéis viveram seu isolamento como uma festa. Devido às circunstâncias proscritas da crise e graças ao seu desejo por Deus, encontraram o poder da vida indestrutível e um contato mais próximo com Cristo. Deus está acima de todas as coisas e, se houver necessidade, Ele pode até mudar Sua lei. O que Ele nos dá por meio da Sagrada Comunhão na Liturgia, Ele pode dar ainda mais generosa e abundantemente no isolamento imposto àqueles que buscam Sua Face. No entanto, precisamos discernir como as coisas são em condições normais e em condições especiais.
Pergunta: Como São Sofrônio costumava vivenciar a Divina Liturgia?
Resposta: O Padre Sofrônio viveu em condições normais em seu Monastério no Monte Athos, mas também viveu em condições especiais no isolamento do deserto, nas condições do mundo ocidental na França, como pároco, de certa forma, depois como fundador do nosso Monasterio, como Igumeno e, no fim de sua vida, como recluso. No cenóbio do Monte Athos, sua vida passou de uma Liturgia para outra. Então, ele se retirou para o deserto, não para celebrar a Liturgia, mas para se entregar a um profundo arrependimento. Aconteceu que, por semanas, ele não abriu a porta de sua caverna para ver se era dia ou noite. Ele estava de joelhos no chão, lamentando inconsolavelmente sua pobreza espiritual, e o Espírito Santo intensificava cada vez mais a consciência de sua pobreza, para que ele pudesse receber inspiração para um arrependimento ainda maior. “Eu tinha todas as minhas toalhas molhadas de tanto chorar, pendurado em uma corda esticada na caverna”, ele me disse. Foi assim que ele viveu no deserto, sem Liturgias frequentes. No Monastério que fundou aqui, reencontrou as condições normais e, então, a Liturgia voltou a ser o centro de sua vida. Quando celebrava no dia seguinte, era impossível aproximar-se dele sem sentir: ele estava transfigurado desde a véspera pela expectativa de se apresentar diante do altar de Cristo.
Foi assim que o Padre Sofrônio viveu a Liturgia. O sacramento da Sagrada Eucaristia sempre foi o centro de sua vida, pois ele sabia que, nesta maravilhosa assembleia da Divina Liturgia, o homem pode dizer a Deus: “O que é Teu, do que é Teu, Te oferecemos em tudo e por tudo”, e então ouvir a resposta de Deus: “As coisas santas aos santos”. Ou seja, o homem pode fazer essa troca de sua pequena vida com a vida infinita e incorruptível de Deus. Esta era a visão do Ancião Sofrônio a respeito da Divina Eucaristia. Ele sublinhou com grande seriedade que a graça perfeita que os hesicastas encontram no deserto pode ser recebida pelos fiéis na Divina Liturgia se eles se aproximarem preparados e adornados com humildade e contrição.
Pergunta: O culto divino na Igreja e a oração privada substituem-se mutuamente?
Resposta: Um prepara o outro e o outro é a perfeição do primeiro. Dependendo da preparação que fizermos em nossa cela, sentiremos o conforto e o poder da Liturgia. Para aqueles que dedicarem tempo para invocar o Nome de Cristo e derramarem abundantes lágrimas em suas celas, a Liturgia será um “vento impetuoso e impetuoso” (Atos 2:2), que os tomará e os introduzirá no mundo da verdadeira Liturgia de Cristo. Padre Sofrônio costumava dizer: “Não salte da sua cama para a Liturgia, tente se preparar, caso contrário você secará”. É claro que, se estivermos doentes ou tivermos que trabalhar muito para atender às necessidades do Monastério, e excepcionalmente não pudermos fazer a mesma preparação, tenho certeza de que Deus não nos privará do que Ele normalmente nos dá durante a Liturgia. Assim, nossa adoração privada, nossa oração privada, é uma preparação para a adoração comum, que nos dará a perfeição da vida espiritual, conduzindo-nos à comunhão da vida e à riqueza dos dons de todos os Santos.
Pergunta: Há um medo, uma insegurança no mundo hoje, especialmente por causa da pandemia. Como podemos superar essa crise?
Resposta: Certo Abba Teodoro diz nos Ditos dos Padres do Deserto: “Mesmo que os céus caiam sobre a terra, não terei medo, pois orei até o fim a Deus para me livrar de todo medo.” “Tu te mostraste forte diante de Mim e também serás forte em teus relacionamentos com os homens e com todos os fenômenos deste mundo”, disse o Senhor a Jacob quando lutou com Ele a noite toda (ver Gn 32:28).
Certa vez, uma presbítera perguntou ao Padre Sofrônio: “Como posso saber se sou salva?” Ao que o Padre Sofrônio respondeu: “É muito simples. Estamos sentados agora nesta sala. Se de repente a porta se abrisse e Cristo entrasse agora, o que você faria? Você diria: ‘Meu Deus, não estou pronto!'” Ou você diria: “Vem, Senhor, glória a Ti, Senhor!”? Se nossa reação for dizer: “Sim, Senhor, venha e tome a glória que pertence a Ti desde a fundação do mundo!”, então não deveríamos ter medo. Cristo nos criou por bondade e amor, Ele nos preserva nesta vida, novamente, por amor, Ele nos salva através de Seu terrível sofrimento e da morte vergonhosa na Cruz para que nós, Seus inimigos, possamos viver. O mesmo Cristo continuamente cuida de nós com a graça de Seu Nome, com a iluminação de Sua palavra e o poder de Seu Corpo e Sangue no Sacramento da Eucaristia. E no fim dos tempos, Ele virá com uma plenitude ainda maior de graça, amor e bondade para nos reunir dos confins do mundo e nos elevar às alturas do céu, para nos conduzir ao Seu Reino nas asas de uma águia, como diz o profeta Isaías (Is 40:31); ou melhor, nas asas de um anjo, porque os anjos serão aquelas águias que reunirão os fiéis desde o confins do mundo, para que possam habitar com Ele eternamente na festa do amor do Pai, do Filho e do Espírito Santo. O importante é fortalecer nosso relacionamento com Cristo, pois se nosso relacionamento com Ele for forte e se vivermos continuamente na expectativa de Sua vinda, respirando a graça de Seu Nome e de Sua Presença, então, quando O virmos chegando, clamaremos em alta voz com entusiasmo e alegria: ‘Vem, Senhor Jesus!’ (Ap 22:20).
Pergunta: Como podemos superar o medo uns dos outros nesta crise?
Resposta: Mais uma vez, a palavra de Deus vem em nosso auxílio. “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, porque Tu estás comigo; a Tua vara e o Teu cajado me consolam” (Sl 23:4). Façamos o que as autoridades nos dizem para o bem comum e confiemos em Cristo. Se clamarmos constantemente a Ele, invocando o Seu Nome, e recebermos a Sua palavra como a única verdade absoluta e autêntica, então não há espaço para o medo. Se formos fiéis a Ele, Ele permanecerá fiel a nós, pois não pode negar a Si mesmo (2 Tm 2:13). O Senhor será fiel para nos defender e para “nos esconder no segredo da Sua presença”, como diz o Salmo (cf. Sl 31:20), cobrindo-nos e protegendo-nos de todo o mal. A Sua presença será terrível apenas para o inimigo e os seus seguidores, mas para aqueles que creem no Seu Nome, há uma solução. Diremos: “Senhor, seremos protegidos somente se Tu nos protegeres”. Glória a Ti.
Arquimandrita Zacarias (Zacharou)
tradução de monja Rebeca (Pereira)









Uma resposta
Obrigada pela excelente Tradução!