Como todos sabemos, São Gregório Palamas é uma grande figura da Igreja Ortodoxa, que com toda a sua teologia – fruto de sua vida em Cristo – conseguiu, em sua época, reviver a Teologia Ortodoxa em toda a sua profundidade. Diz-se no Monte Atos que a teologia de São Gregório Palamas preencheu todas as lacunas do passado e do futuro.
O santo athonita iniciou sua vida na Santa Montanha, no monastério de sua “penitência”, ou seja, onde foi tonsurado, o Grande Monastério de Vatopedi, sendo instruído nos deveres do espírito e na vida ascética por São Nicodemos, o Hesicasta de Vatopedi. Iluminado pelas energias incriadas do Espírito Santo, São Gregório adquiriu sabedoria espiritual e tornou-se um notável mestre das virtudes e da vida segundo Deus.
Seguindo a pura tradição patrística, não aceitou uma visão moralista da vida espiritual, que alguns tentavam trazer do Ocidente e projetar na esfera da Ortodoxia.
Ao longo de toda a tradição patrística, enfatiza-se que o arrependimento não se esgota em certas melhorias objetivas de comportamento, nem em formalidades e padrões externos, mas sim em uma mudança mais profunda e geral no interior da pessoa. Não se trata de um sentimento passageiro de opressão pela consciência de ter cometido algum pecado, mas sim de um estado espiritual permanente, no qual a pessoa se volta firmemente para Deus e demonstra uma disposição duradoura para a reforma, a cura e o engajamento na luta espiritual. O arrependimento é uma nova perspectiva, uma nova e correta direção espiritual que deve acompanhar as pessoas até o momento da morte. O arrependimento é a progressão dinâmica do estado antinatural das paixões e do pecado para o estado de naturalidade e virtude; é a rejeição total do pecado e o caminho de retorno a Deus.
São Gregório Palamas ressalta repetidamente essa verdade. “O arrependimento”, diz ele, “é odiar o pecado e amar a virtude, renunciar ao mal e praticar o bem”. Fica perfeitamente claro, a partir dessa definição, que o Santo Padre não conseguia enxergar o arrependimento como uma mudança formal e mecânica, já que o define como uma renovação ontológica da pessoa. Precisamente por essa razão, o fato do arrependimento não pode ser objetivado dentro das dimensões de uma receita ou tática impessoal, mas é sempre uma revelação pessoal contingente. “A pessoa que se arrepende de alma alcança a Deus pelas boas intenções e pela abstenção do pecado” (Homilia 3, PG 151, 44B).
Para Palamas e todos os Santos Padres em geral, essa natureza pessoal do arrependimento impede qualquer matiz de piedade que o Ocidente tenha querido atribuir ao arrependimento e, consequentemente, a toda a vida espiritual. O santo hesicasta enfatizou que: “A piedade não está nas palavras, mas nas ações” (Ao Filotheos 6, Escritos II, p. 521).
Mas, como o arrependimento é o princípio e o fim da vida em Cristo e o objetivo dessa vida, segue-se que tudo será visto através dele e adquirirá mérito ou desmérito. Mesmo “a fé é benéfica se as pessoas vivem suas vidas em boa consciência e se purificam novamente pela confissão e pelo arrependimento” (Homilia 30, PG 151, 185A). Isso, em todo caso, é dado como promessa e acordo no momento do Santo Batismo.
Uma etapa fundamental, que precede o arrependimento, é o reconhecimento e a consciência dos pecados, “que é a grande causa da propiciação”, como disse o Santo Arcebispo de Tessalônica (Homilia 28, P.G. 151, 361C). Segundo Palamas, para que as pessoas cheguem ao arrependimento, basta que primeiro reconheçam “suas próprias transgressões” e mostrem estarem descontentes consigo próprias diante de Deus, a Quem recorrem “com coração contrito”. Eles se lançam no mar da Sua misericórdia e creem, como o Filho Pródigo, que são indignos da clemência de Deus e de serem chamados Seus filhos. E quando, reconhecendo e conscientes de sua pecaminosidade, atraem sobre si a misericórdia de Deus, obtêm a libertação completa por meio da autocensura e da confissão.
Em seus esforços para definir todas as etapas do arrependimento, o sábio Padre disse o seguinte: “O reconhecimento dos próprios pecados é seguido pela autocondenação; esta é a tristeza pelos pecados que Paulo declarou ser piedosa. Ele nos diz que essa tristeza é seguida pela confissão a Deus com um coração contrito, pela súplica e pela promessa de evitar o mal no futuro. E isso é o arrependimento.”
Como uma nova condição na vida das pessoas, o arrependimento é acompanhado por certas consequências que, na linguagem bíblica e patrística, são chamadas de “frutos do arrependimento”. O primeiro deles é destacado por São Gregório como sendo a confissão, visto que, por meio dela, se alcança a cura e a purificação da alma do crente e se inaugura a nova vida: “Pois a confissão dos pecados é o início deste cultivo, isto é, do arrependimento e da preparação para que as pessoas recebam em si mesmas a semente da salvação, que é a Palavra de Deus” (Homilia 56).
A confissão não é, contudo, o único fruto do arrependimento. Arrependimento. Ao chamar as pessoas ao arrependimento por meio de sua pregação, São João Batista as exortava a abraçar a caridade, a justiça, a humildade, o amor e a verdade, bem como a confissão, porque esses são os atributos do poder transformador da verdade.
Em sua Homilia 23, o santo hierarca athonita enfatiza que as pessoas que realmente vivem o arrependimento não retornam aos seus pecados anteriores, nem se apegam a pessoas e coisas corruptas, nem se entregam a prazeres duvidosos, mas, ao contrário, desprezam o presente, olham para o futuro, lutam contra as paixões, buscam as virtudes, são vigilantes na oração, não buscam lucros injustos, são indulgentes com aqueles que lhes fizeram mal, compassivas com os que suplicam e dispostas a ajudar, com palavras, ações ou mesmo sacrifícios, os necessitados. E quando São Gregório exorta os cristãos a adquirirem obras de arrependimento, ele destaca particularmente uma perspectiva humilde, compunção e tristeza espiritual. Resumindo todos os atributos daqueles cristãos que vivem seu arrependimento, ele diz que eles são serenos e calmos, cheios de misericórdia e compaixão para com os outros, desejam a justiça, buscam a pureza, têm paz e a trazem, sofrem a dor e as dificuldades com paciência e sentem alegria e satisfação nas perseguições, nos insultos e calúnias, nas perdas e em tudo o mais que sofrem em nome da justiça e da verdade (Homilia 31, PG, 151, 392C).
O caminho da correção através do arrependimento, da libertação da escravidão às paixões e do ascetismo para seguir os mandamentos divinos é o caminho dos seres santos que foram glorificados. Partindo dessa verdade, São Gregório enfatiza o seguinte: “Se nem todos os cristãos podem igualar os Santos e as grandes e maravilhosas realizações que caracterizam suas vidas e que são, em seu conjunto, inimitáveis, eles podem e devem imitá-los e segui-los em seu caminho rumo ao arrependimento. Porque, no dia a dia, ‘inconscientemente pecam em muitas coisas’ e a única esperança de salvação para todos nós permanece, segundo São Gregório, o abraço e a vivência do ‘arrependimento constante’ (Homilia 28, PG, 151, 361C).”
O remorso como condição para o ascetismo
Uma condição fundamental para a libertação dos grilhões das paixões e, ao mesmo tempo, para o início e a fonte do arrependimento é o remorso piedoso, o que os Padres chamam de “luto”. Em seus textos, São Gregório se refere com muita frequência a esse “luto” e à condição dolorosa, mas também jubilosa, pela qual os cristãos devem passar se quiserem viver a verdadeira vida.
Por isso, ele não hesita em chamar a Grande Quaresma de período supremo de luto e luta espiritual, como símbolo da época presente e condição prévia para a ressurreição da vida dos fiéis.
São Gregório, que realmente viveu o arrependimento piedoso e que disse que seus profundos suspiros “iluminaram minhas trevas”, com razão não conseguia entender como alguém poderia passar da vida de pecado para a “vida real” sem remorso e arrependimento. Ele disse que, quando a faculdade da percepção direta, o “nous”, se liberta de tudo o que é perceptível, ela se eleva acima do turbilhão das coisas terrenas e pode ver a pessoa interior, pois é capaz de perceber o que ele chama de “máscara odiosa” que a alma adquiriu por sua vagueza entre as coisas mundanas. Nesse ponto, ela se apressa em purificar a impureza com lágrimas de arrependimento (Discurso sobre Pedro, o Athonita, PG, 150). Quanto mais as pessoas se distanciam das preocupações mundanas e retornam a si mesmas, mais receptivas se tornam à misericórdia divina. Cristo elogiou aqueles que choram por seus pecados e pela perda da salvação, causada pelo pecado. Esta é, em todo caso, a razão pela qual esse remorso é chamado de “bem-aventurado”.
Embora, segundo a tradição patrística e ascética, o luto seja fruto de Deus, ele pressupõe a cooperação das próprias pessoas, o que requer humildade, autocensura, mortificação, jejum, vigilância e, sobretudo, oração. E essa persistência no cultivo das virtudes e na busca do remorso piedoso é reforçada pela experiência do hesicasmo, que testemunha que esse “luto” não causa debilidade e desesperança, mas cria nas pessoas as condições para experimentar alegria espiritual, consolo e, segundo Palamas, “a obtenção de doce alegria” (A Xenia, PG, 150). E quando auxilia a nous a levantar o véu das paixões, introduz-a suavemente nos verdadeiros tesouros da alma e a habitua na oração “em segredo” ao Pai.
Há muitas razões que devem levar os fiéis ao luto. Assim como os discípulos do Senhor se entristeceram quando foram privados do “verdadeiramente bom Mestre, Cristo”, nós, que experimentamos a mesma privação e ausência de Cristo em nossas vidas, devemos ter em nós e cultivar essa mesma tristeza (Homilia 29, PG, 151). Mas há também outra razão para o luto: a expulsão do reino da verdade no paraíso para o reino da dor e das paixões. Essa queda é tão dolorosa porque contém todo o drama do banimento de Deus, a retirada do diálogo “pessoa a pessoa” com Ele, da vida eterna e da co-glorificação com os anjos. São Gregório pergunta quem já se deu conta da privação de todas essas coisas e não se lamentou? E exorta todos os fiéis que vivem “conscientes dessa privação” a se lamentarem e a lavarem com remorso piedoso “as manchas dos pecados” (Homilia 29, PG 151). Esta exortação por parte do santo está totalmente de acordo com a exortação e a experiência da Igreja, que, na hinografia para o Domingo da Semana da Tirofagia, convida os cristãos, na véspera da Grande Quaresma, a lembrarem-se do seu banimento do Paraíso perdido e a lamentarem tal perda.
Arquimandrita Efraim de Vatopaidi
tradução de monja Rebeca (Pereira)






