1) Como se deu seu contato e vivência na Ortodoxia? E o chamado ao sacerdócio? Foi como que uma continuação do Serviço ao Senhor? Conte-nos de seu caminho de conversão desde o Presbiterianismo.
Em meus últimos anos de seminário no Presbiterianismo, fui algumas vezes a uma paróquia ortodoxa. Estudava teologia no regime de internato em total dedicação ao curso e às demandas da igreja em que havia nascido.
Na época, uma prima de minha noiva era uma fiel, pertencente aos primeiros batizados ortodoxos da Igreja em Recife; foi a ela que pedi para conhecer a Igreja Ortodoxa. Ali chegando, comecei a folhear o livro de Liturgia, encontrando orações feitas pelos cristãos nos primeiros séculos da história da Igreja, orações sobre as quais eu havia pesquisado em meus estudos de teologia.
Desde o início da Divina Liturgia, no entanto, o rito ortodoxo surpreendeu a minha alma naquele momento ímpar, além de passar, a partir dali, a ocupar o foco de minha existência. Todo o restante de minha trajetória no seminário, e de meu ministério pastoral posteriormente, foi uma tentativa desesperada de desconstruir aquela profunda e decisiva experiência litúrgica porque passei, pois se tornara uma questão existencial para mim. Afinal, ela se levantou como algo inteiramente estranho à meu contexto de vida. Mais adiante, pude compreender que se tratava, como até hoje, da própria salvação de minha alma. Sim! A salvação passa pelos Santos Mistérios da Igreja, os quais tanto custei para abraçar. Minhas pesquisas não me permitiam negar mais o mistério revelado da Presença Real de Cristo na Santa Eucaristia da Igreja. Muito para além do racional, a teologia era, sobretudo, sacramental. Liturgia era, de fato, algo inegociável e isso eu jamais teria confirmado não fora aquela bendita experiência com a Ortodoxia da Igreja.
Foram cerca de 18 anos de luta interior até que a Divina Providência se valeu de todo um contexto de política eclesiástica no seio do Presbiterianismo para convencer-me a abandonar tudo e seguir a Cristo, recebendo o Seu Santo Corpo e o Seu Precioso Sangue no seio da Igreja em Sua Ortodoxia. Tudo me era desfavorável. Nada me serviria de amparo, exceto o cuidado divino e a existência da Igreja em nossa região, mesmo por entre todos os seus limites.
Fui batizado num Domingo, aos 06 de novembro de 2005 e, desde então, me mudei de Recife, a capital do Estado, para a cidade, hoje protegida por Deus, de Caruaru, e isso literalmente pelas dificuldades financeiras e profissionais que me sobrevieram.
Em Caruaru, pude permanecer no Seminário da Igreja Romana, onde já ensinava as disciplinas de Grego e Hebraico. Ali, ensinei por 16 anos de minha vida. Permaneço ensinando no Seminário Episcopal Carismático, uma ramificação do Anglicanismo tradicional, o único que me manteve em seu quadro de professores até hoje.
Em 2006, iniciamos uma pequena Missão da Igreja Ortodoxa que foi visitada, na ocasião, pelo bispo Ortodoxo sérvio, Mitrofan (Kodich), então bispo nos Estados Unidos, hoje no Canadá. Ele me ordenou Hipodiácono. Foi-me permitido conhecer a Igreja em solo norteamericano, especificamente na Califórnia em 2010.
Em 2012, fui conhecer a Igreja na Sérvia e em Montenegro, onde fui ordenado Diácono pelas mãos do então Metropolita, Vladika Amfilohije (Radovich), que me ordenou ao Sagrado Sacerdócio no Brasil naquele mesmo ano, além de vir a Caruaru para a sagração da Paróquia Ortodoxa de São João Crisóstomo que construí entre 2016 e 2019. Desde, então, sirvo a Santa Igreja naquele bendito lugar.
2) Quanto à sua paróquia? Onde se encontra, quem frequenta, como e com que frequência são celebrados os Serviços Divinos, existe algum coro, famílias com criança, trabalho social ou semelhante, catequese…
A paróquia de São João Crisóstomo fica localizada nas proximidades do cruzamento das duas principais BRs do Estado de Pernambuco, sendo de fácil localização. A localização pelo Google Maps é igualmente possível.
Limitamo-nos à celebração da Divina Liturgia aos Domingos pela manhã. Não temos ainda um côro, apesar de muito sonharmos em tê-lo. Temos quatro famílias de paroquianos com crianças, além de crianças do bairro que geralmente não são trazidas pelos próprios pais. Não optamos por trabalho social, mas incentivamos e oportunizamos a caridade para com as pessoas da vila carente em nossa vizinhança. Nossa catequese é feita esporadicamente e online.
3) Soubemos que o senhor coordena uma Missão em Maceió. Fale-nos sobre esta realidade, por favor.
Recebi a bênção do Bispo Kirilo (Bojovich) para, em um primeiro momento, celebrar em lares na cidade de Maceió e, mais recentemente, para iniciar a Missão Ortodoxa Sérvia de São Basílio de Ostrog, pela qual temos mais rezado do que coordenado, dada a necessidade de uma política missional mais acertada e coordenada por parte das Jurisdições Ortodoxas no Brasil, em face do que temos optado por uma morosidade intencional a fim de que tudo ocorra em real conformidade com a vontade de Deus.
4) Na sua opinião, como manter uma relação saudável com os heterodoxos no Brasil? Conte-nos de sua experiência enquanto professor e do contato com pessoas de diversas confissões religiosas.
A melhor forma de lidar com os heterodoxos no Brasil passa mais por nós do que por eles. A heterodoxia brasileira é desesperadoramente crescente e caracteristicamente invasiva, quando não é, até mesmo, agressiva. Penso que somente se a Igreja veicular as jurisdições brasileiras em termos infraestruturais, é que nossa relação com os heterodoxos ganhará respeito e confiabilidade. Em poucas palavras, eles precisam confiar que estamos realmente ligados às jurisdições ortodoxas, à medida que a estrutura da Igreja Ortodoxa se evidenciar como realidade em nosso contexto. Só, então, eles deixarão de nós desconsiderar e passarão a nos respeitar, quer nos incluindo no contexto religioso brasileiro, o que redundará em mais conversões de brasileiros à Ortodoxia e em uma significativa e efetiva cooperação sóciocultural e sociopolítica por parte de nossas jurisdições, quer nos excluindo de tão alvissareiro contexto, o que implicará em uma perseguição declarada, e não mais velada, como a que experimentamos no Brasil.
5) Como o senhor concebe a aproximação de buscadores sedentos pela Ortodoxia? Como guiar estes jovens que acorrem?
Não podemos, nem devemos nos concentrar na evangelização, quer por falta de infraestrutura, o que é culpa nossa, quer por causa da superficialidade dos buscadores, o que não é somente culpa deles, mas resultado inevitável do ethos religioso brasileiro, superficial e mercadológico
6) Ousamos pedir que nos conte sobre a realidade transformadora que o senhor vivenciou no que concerne a veneração à Toda-Santa Mãe de Deus, aos Santos e as santas relíquias.
Considero a experiência por que tenho passado, tanto quanto a de muitos em nosso contexto, um verdadeiro milagre da Graça Incriada em Sua bondade inefável e indizível generosidade. Não tinha sequer elementos contrários para contestar e desconsiderar tudo o que me era transmitido pela Igreja em sua Ortodoxia. Contudo, a força indescritível e suficiência inalienável da Santa Tradição que as jurisdições ortodoxas, consciente ou inconscientemente, veiculam em nossas tímidas iniciativas missionárias, me socorreram e alcançaram. A Deus toda glória!, como balbuciou até o fim nosso querido patrono São João Crisóstomo.








